Mundos Paralelos - capítulo 5 - 5.2

5-5.2

25 de maio de 2013. Ao amanhecer.
Após muito esforço, Aldo, Inge e Regina sentiram-se preparados para tentar a primeira comunicação com os nativos.

Os três passaram a noite; juntos; nas camas da enfermaria com a máquina de táquions dos Alfas, ligada nas suas cabeças. Do lado de fora, no extremo da linha, dois marcianos ficaram ligados a noite toda. Aldo; com uma terrível enxaqueca; retirou os eletrodos da cabeça e trocou algumas palavras com as garotas na língua marciana.

O esforço provocou-lhes náuseas e irritação, sentiram fluir novos conceitos, totalmente estranhos aos seus cérebros. Não deviam ter tentado fazer tudo numa noite, talvez deveriam ter realizado a experiência mais devagar. Agora sofriam as conseqüências da saturação devido à rapidez com que os dados foram introduzidos nos seus cérebros.

Aldo e as moças olharam-se incrédulos uns aos outros e conseguiram entender-se com seus cérebros ainda em fogo. Não sendo muito difícil foneticamente de falar, a língua marciana, chamada gopaki, parecia quíchua, mas tinha palavras que pareciam sânscritas e algumas de línguas mortas da Terra.


Aldo já sabia os nomes dos prisioneiros; o ferido era Garl, motorista, outro era Dorn, mecânico, outro era Nig, explorador chefe de grupo, e o último era Lon, arqueólogo chefe, que foi surpreendido espionando o acampamento. Aldo entrou na garagem e encarou o marciano Lon, que tinha mais de dois metros de altura.
Na Terra, pesaria em torno de cem quilos. Seu corpo delgado seria bem proporcionado pelos padrões terrestres se não fosse pelo peito amplo, com seus
grandes pulmões. A pele grossa, sem dúvida imune aos raios ultravioletas, era clara. A cabeça de forma quase oval na parte de cima, tinha cabelo preto raspado
artisticamente, formando desenhos curvos diferentes dos seus camaradas. Era evidente que o corte de cabelo era uma marca de distinção entre eles. Os olhos negros, penetrantes, eram inteligentes e decididos, talvez pelas estruturas ósseas que protegiam-nos como uma viseira.

Na testa, como um terceiro olho, ostentavam uma jóia vermelha, encravada na pele. Parecia ser um padrão estético. Os lóbulos perfurados das orelhas careciam de brincos. Nenhum deles tinha, apesar de que todos tinham os lóbulos perfurados. Estavam preparados para a intempérie. Roupas de abrigo padronizadas; calças e camisas de tecido resistente e grosso; jaqueta de couro trabalhado e botas altas até a metade da coxa; trabalhadas de couro grosso; equipadas com bolsos. Olharam-se alguns segundos. Aldo disse:



–Sat um ert spoka – (Agora vamos conversar.).


–Haremos lo posible – (Faremos o possível) – respondeu Lon em espanhol.


–Ora, ora! Aprenderam rápido vocês!


–Vocês também, sua pronuncia é excelente.


–Gracias. Em que idioma preferem que lhes fale?


–Ambos. Será melhor. Não sabia para que eram os fios ligados em minha cabeça; até aparecerem palavras estranhas na mente e...


–Vamos ao que interessa. Sou chefe desta expedição. Meu nome é Aldo.


–O meu é Lon.


–Sim, já sei. E também sei que você comanda seu grupo. Antes de qualquer coisa, quero saber se é possível entrar em contato com a sua gente e se é possível parlamentar com alguém que tenha autoridade para falar em nome da sua espécie, para fazer um primeiro contato amistoso.


–Vocês estão armados. Não convencem da sua boa intenção. Mataram grande quantidade de fauna por aqui.


–Para defender-nos.



–Entendo, mas também mataram um gopaki (marciano).


–Estava morto com uma flecha no peito quando o encontramos.


–Acredito. Não o teriam enterrado se não fosse assim. Nós levantamos essa hipótese. Mas, de que mundo vocês procedem?


–Do planeta Terra, o terceiro deste sistema solar.


–Terra? O conhecemos como Xarn (Azul).


–Como somos chamados por vocês?


–Analgopakin (espacianos). Já esperávamos outra visita. Numa outra urbe perto desta região; Darnián; os cientistas ouvem transmissões radiais do seu mundo e
pegaram alguns objetos enviados por vocês.


–Outra visita? – Aldo, lembrou do tanque d'água em órbita – Será que alguém
chegou aqui antes do que nós?


–Parece que sim.


–Mas você não entrou em contato com eles... Ou talvez sim?



–Não. Foi há mais de trinta ciclos. Só os velhos lembram disso. Os darnianos possuem rádios possantes e gostam de pesquisar o espaço exterior. Receberam dois grupos. Um deles parece que vinha do seu planeta, escapando de uma guerra e o outro grupo vinha de fora. Parece ser que ambos se encontraram, chegaram a um acordo e partiram juntos.


–Fascinante – disse Aldo e ficou em silêncio.


O marciano parecia ter um nó na garganta quando disse:


–O que vão fazer conosco? Matar-nos; imagino que não. Deve ter dado muito trabalho ensinar-nos sua língua. Eliminei essa possibilidade. Invadir... Já invadiram, depois vem o domínio...


–At quant lones ger yu ñe ça? (Até quando vai dizer bobagens?).


–Desculpe.


–Quero comunicar-me com a cidade do outro lado do canal, de onde acho que você é, e com a outra ao sul daqui, aquela que você chama de Darnián. Preciso pesquisar informação sobre os visitantes do passado e entender-me com seus superiores, se é que vocês os têm e oficializar minha visita ao seu mundo. Quero que saibam o que vim fazer e que o farei de qualquer jeito, queiram vocês ou não.


–Não entendi suas intenções...


–Vocês estão bem organizados e armados – respondeu Aldo – e isso quer dizer governo e forças armadas, o que pode significar oposição a mim. Quero esclarecer
tudo o que for possível. Quero ser bem entendido.


–Seria bom começar por mim mesmo – disse o marciano – poderia começar por explicar-me o que veio fazer no meu mundo.


–Bem pensado. Antes de tudo, explorar e conhecer para aumentar nosso conhecimento. Depois estabelecer uma cabeça de ponte para outros mundos que pretendemos visitar.


–Só não entendi o motivo de atirar em mim com intenção de me matar...


–Se quiséssemos matá-lo – interrompeu Aldo – você já estaria morto. Você nos assustou, aparecendo de repente, e fugiu como um criminoso.


–Eu só queria observá-los...


–Priqe em ham fu gop (Ponha-se no meu lugar)


–Certo, pelo nosso carro destruído, pela perna de Garl, por nossa captura, pela nossa prisão. Confortável, porém prisão ao final...


–Vocês não são prisioneiros. Considerem-se hóspedes. De acordo?


–De acordo. Agradeço sua hospitalidade. Agora podemos ir?


–Podem. Mas antes gostaria da sua ajuda para entrar em contato com o seu governo ou alguém com quem eu possa negociar.


–Se me acompanha até o carro, verei de entrar em contato com a minha Urbe... Isso se o rádio ainda funciona...


–Vamos ver isso, então. Venha comigo.


O antártico e o marciano saíram da garagem, enquanto os outros marcianos ficavam mais tranqüilos ao ver que as coisas começavam a ficar menos incertas.

A base agora era enorme. Os antárticos alisaram o terreno num diâmetro de 2000 metros, cujo centro continuava sendo o mastro da bandeira. Os postes de campo deixavam uma entrada ao sudeste. A pista principal estava orientada de leste a oeste, a segunda de noroeste a sudeste e a terceira de norte a sul. Estas ainda em construção, como os cinco tanques de combustível, que uma vez terminados teriam capacidade para 60 milhões de litros cada.


Estavam em construção três grandes depósitos de carga e descarga. Quatro hangares estavam terminados e em uso. Três jardins hidropônicos já produziam e três estavam em construção. Oito grandes alojamentos em forma de iglus estavam em construção e dez menores estavam terminados. A torre de controle estava em fase final e operando.
Fora concluído um posto de abastecimento junto à terceira pista. O convertidor de atmosfera produzia oxigênio puro que estocavam em cilindros.
Na parte sul; foi instalada uma torre de perfuração para encontrar água.
No céu, de tempo em tempo, apareciam grandes pára-quedas com material, na medida em que era requerido, e os veículos partiam do acampamento para recolhê-los.

Lon estava maravilhado com tudo isso.


–Você faz as coisas em grande.


–Meus objetivos são grandes.


Quando chegaram ao carro, Lon procurou o rádio entre a bagunça.


–Não funciona – disse após uma tentativa – A fonte de energia foi destruída.


–Desmonte-o. Vamos levá-lo ao nosso técnico.

*******.
Julián Cables Torres, radiooperador chileno da Polaris, sorriu satisfeito, através do visor do capacete.
Estavam na garagem. Numa mesa, o rádio marciano, ligado numa rede de fios e baterias, preste a ser testado.


–Com estas baterias em paralelo deve funcionar. A energia que usam não é diferente da nossa. O problema é adivinhar a amperagem, para não queimar tudo.


–Has dat, Lon. Prist test! (Vamos ver, Lon, experimente!).


–Acende, mas a energia é pouca.


–Ligue mais duas, Cables.


–Sim senhor. Mais 24 volts. Lá vai!


–Has nha's! Has das virt n'rert! (Agora sim! Agora funciona bem!).


Aldo disse, impaciente:


–Has hi spoka in ur gops (Agora se comunique com os seus)


–Tast has in yui (farei o possível).


Após duas tentativas, Lon contatou sua companheira Danai. Lon explicou -lhe a situação. Danai disse que Vurón e seu grupo não voltaram. Lon disse que os visitantes nada tinham a ver com isso e melhor seria iniciar uma busca no canal.


–E ao respeito de sua situação com os alienígenas?


–Querem falar com nossos líderes, para tratar de sua estada aqui.


–Lon! Já sabe que o Rei está viajando e não voltará até o verão.


–O conselheiro Nig poderia tomar conta do assunto se o Alto Comando não se opuser... Entre em contato com o meu pai. Estarei à escuta.


–Farei isso. Cuide-se, Lon.


–Estarei bem, não se preocupe.


–Quem é ela, Lon, sua esposa? – perguntou Aldo em espanhol.


Lon buscou na mente o significado de "esposa" em espanhol. Surgiu "par", "companheira", então disse:


–Sim. Vai comunicar-se com o meu pai, que é líder militar.


–Pode ser útil. Como estão organizados os exércitos aqui?


–Os caesars (generais, líderes) são donos do seu território e do seu exército, a produção de armamento e alimento das tropas. Estão subordinados ao Rei; mas cada líder é rei no seu território, como eu já disse.


–E o território do seu pai é na cidade entre os lagos?


–Não. Meu pai possui uma zona de produção num local distante, ao Nascente de Hariez, a região onde nasci.


Aldo buscou na mente o significado de Hariez. Sentiu dor de cabeça quando voltaram as ordens subliminares da máquina hipnopêdica...


–Hariez... (mesopotâmia, terra entre águas) – pensou Aldo e disse:


–Você conhece todas as cinco regiões habitadas do seu mundo?


–Não. Todas não. Pretendo um dia, fazer uma viagem de iniciação.


–Iniciação?


–Sim, para conhecer o mundo... Mas como você sabe que são cinco?


–Vi todas de cima. Dei várias voltas ao redor do mundo, para mapeá-lo.


–Então você tem mapas...


–Sabemos quase tudo do seu mundo, exceto os nomes das regiões.


–Bom, além de Hariez, minha região; Darnián, ao sul, perto daqui; Atlantos, no hemisfério Sul, muito longe; Guaztitlán, ao Poente, muito longe; Angopak, que é subterrânea; do outro lado do mundo. Há aldeias dispersas, centros habitados por caçadores, agricultores ou pescadores na beira dos canais, todas lideradas por pequenos pachas (chefes). Nós em Hariez não conhecemos bem nosso mundo.


–Vocês não possuem naves aéreas?


–Não como as de vocês. Temos vimanas pequenas para quatro tripulantes, que se usam para observação à curta distância, porque consomem muita energia.


–Ah! Mas vocês dominam essa técnica e ainda não foram ao espaço?


–Não foram criadas por nós, senão pelos deuses ranianos que caminharam pelo mundo e foram embora para não voltarem mais.


–E por que não o fizeram?


–Segundo as crônicas de Angopak, o mundo deles desapareceu num cataclismo que abalou todo o sistema planetário.


–Como eu faço para saber mais sobre isso?


–Há historiadores. Sou arqueólogo e procuro indícios das visitas dos ranianos.


–Suas naves poderiam ser aperfeiçoadas... Se eu pudesse ver uma delas...


A luz acendeu-se, indicando que alguém tentava entrar em contato.


–Inka! Priqe in virt n'rert? (Filho! Você está bem?)


–Das, go virt n'rert, ra (Sim, estou bem, pai).


–Diga-me sua posição para ir ao resgate.


–Ao Poente da Havern Umbr. Os visitantes montaram uma cidade aqui.


–Seu colega Vurón desapareceu. Não responde aos chamados...


–Sei, mas os visitantes não estão envolvidos nisso.


–Estou partindo para onde você está, imediatamente.


Lon desligou o radio.


–Ouvi e entendi tudo, Lon.


–Espero que cheguemos a um acordo satisfatório para todos.


*******.

Mundos Paralelos ® – Textos: Gabriel Solis - Arte: André Lima.

Comentários

  1. Que base você usa para criar a lígua marciana?

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  2. Sánscrito, aymará e alemão antigo. além de algumas linguas mortas. Há um glossário, ainda não terminado, que pretendo publicar.
    Obrigado por visitar meu blog.

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  3. Seu blog é um dos que costumo visitar permanenmente, porque as postagens são ótimas. Eu também mantenho um blog de Ficção e Fantasia, e sou fanático por Star Trek. Atualmente, preparo meu primeiro livro de FC por conta própria.

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  4. Já visitei seu blog.
    Você é bem criativo.
    Mundos paralelos é uma saga em nove volumes.
    Só será publicado o primeiro.
    os outros só em papel.
    Há outros contos e poesías do autor em recandodasletras.
    Pode ler clicando no nome de Gabriel Solis, o autor de Mundos Paralelos, no blog.

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