Mundos Paralelos - Capítulo 2 - 2.4

(2.4)
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Passavam os dias em rotina organizada para não esquecer onde estavam, mas não rigorosa para não ser maçante.
Comida; asseio e arrumação eram feitos por turnos.
A manutenção era feita pelos homens, tanto na própria nave como no container de carga e nos motores desligados.
Navegavam em inércia, mas precisavam ser examinados periodicamente e os circuitos testados a fundo. Era preciso ter sempre a ponto o gerador principal e os auxiliares, para uma emergência. A carga devia ser verificada constantemente. Os tripulantes patrulhavam os porões da nave e do container; onde toneladas de equipamento valioso; não pelo custo, mas pela sua utilidade; estavam depositadas. A manutenção do hardware do sistema principal, os auxiliares e os terminais; era a função de Inge, que criava o software que fosse sendo necessário às rotinas. Não podiam depender da macro-rede da Terra, a Internet, porque foi criada e estava a serviço do inimigo, tornando-se perigosa. Existia a Rede Privada Antártica de Computadores, a REDPAC, de qualidade superior à Internet; uma rede criada pelo pai de Inge, onde os inimigos não conseguiam invadir sem sair com um poderoso vírus mutante de computador que destruía seus sistemas. Um supercomputador auxiliar, empacotado, viajava no porão para ser montado na base ao chegar a destino.
Regina mantinha atualizada a base de dados. Havia milhares de gigabytes armazenados nas enormes unidades de memória. Transportavam todo o conhecimento de um planeta com eles. Tudo o que seria necessário para um novo começo.
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Os kms passavam a 120.000 por hora sem notar-se. Os humanos estavam aquecidos e protegidos, aprendiam algo novo a cada dia, inclusive os que já tinham experiência no espaço.
Se bem o trabalho mantinha todos ocupados, a rotina previa um lazer após oito horas. Assim, dispunham de oito horas para dormir e oito para aproveitá-las como bem entenderem. No porão, praticavam exercícios físicos para evitar a atrofia dos músculos, apesar da gravitação artificial de cinqüenta por cento.
Aproveitavam também a vasta biblioteca do sistema com tudo o conhecimento humano, a literatura e os clássicos musicais. O doutor Nico Klinger não deixava passar nada nos testes médicos periódicos, abastecendo a base de dados.
Por primeira vez Aldo comandava uma nave com tanta gente, mas, apesar dos recentes incidentes, a Antílope funcionava à satisfação e tudo corria bem. Esperava-se que agüentassem a viagem sem incidentes, uma hipótese remota, já que todos se conheciam de crianças e tinham um relacionamento íntimo e amistoso.
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A medida em que se aproximavam do seu destino; o planeta vermelho à sua frente fazia-se maior e mais nítido à simples vista e na tela do telescópio. Girando em torno de si mesmo, Marte mostrava toda sua superfície a cada 24 horas e meia; que os antárticos munidos de instrumentos observavam do seu ponto privilegiado; que a cada segundo os deixava mais próximos; advertindo detalhes completamente desconhecidos, se comparados com o arquivo de imagens.

–Fomos enganados pela ditadura – disse Marcos. – este parece um mundo bem diferente do Marte que conhecemos.

–Que achamos que conhecemos – disse Aldo – Vamos encontrar algo mais do que areia e rochas, como a sonda Viking nos fez acreditar.

–Nada coincide com os mapas – disse Marcos – disseram que era um mundo morto, mas há manchas esverdeadas que parecem vegetação. E os pólos são de gelo, não de dióxido de carbono, como nos disseram. Nesta distância o espectrógrafo não pode estar errado... E há mais oxigênio do que pensamos.

–Isso é muito bom! – disse Regina.

–Não o celebre ainda. Não parece suficiente para respirar sem equipamento.


–Notaram a imagem de um rosto, que aparece na tela?

–Sim, Regina, A Grande Face de Cidônia – disse Inge – Valerión nos mostrou uma foto antes de irmos a Blumenau. Tem um km de comprimento...

–Temos a foto original no arquivo?

–Temos, Regina – disse Inge dedilhando no terminal – aqui está!




A foto em preto e branco da Face e de umas pirâmides apareceu na tela junto à
imagem colorida em vivo que aparecia no vídeo-telescópio.



–Valerión tinha razão. Aliás, nossos mentores estavam certos.


–Notaram que a Face e as pirâmides não estão onde deveriam, segundo as coordenadas de referência das fotos? – perguntou Inge.

–Deixe-me ver isso – disse Aldo.

Na tela apareceram coordenadas verdadeiras da região de Cidônia, atualizadas
pelo sistema e as fictícias, fornecidas pela base de dados da Terra.


–Se dependêssemos dos dados deles; uma vez com os pés no chão nunca acharíamos o local – observou Lúcio – a ditadura pensou em tudo!

–Parece até que os dominadores previram desde o século passado que alguém
chegaria antes do que eles – disse Boris.

–Eles se prepararam séculos para o domínio mundial e se o conseguiram foi por sua privilegiada inteligência para o mal... Essa gente é a quinta essência do mal.

–Claro Aldo! Não é de duvidar que planejassem estender-se aos planetas.

–Isso já me passou pela cabeça, amigos – interveio Lucio Cardelino – talvez contem com a ajuda dos alfas cinzentos, quando a Terra; carcomida pelo câncer que eles são; já não mais lhes sirva.

–Vamos chegar primeiro – disse Aldo com firmeza – e os deteremos a sangue e fogo, se vierem atrás. Não se esqueçam disso!

–Algo deve haver lá que não querem que saibamos, Aldo – disse Regina – e não deve ser apenas essa enorme Face. Algo tão perigoso para o governo mundial; que
mandou uma esquadra de mísseis à nossa frente a esperar-nos e destruir-nos.

–O quê poderá ser tão secreto e perigoso para eles?

–Algo que devolva a esperança ao mundo escravizado, Boris; não só o desejo de evitar que fujamos dele. Receiam, talvez o que possamos anunciar ao mundo ao chegar. Os mísseis que enviaram a nos destruir indicam que estamos no caminho
certo.

–Talvez achemos a solução para acabar com a opressão – observou Marcos.

–Valerión estava certo quando disse que nossa missão seria o equivalente à missão de Colombo em 1492.

–Colombo não resolveu nada, Aldo – observou Regina – Os males da Europa foram para o Novo Mundo, que ficou tão podre como o Velho em poucos séculos.

–Naquela época não se controlava quem saía da Europa e os colonizadores não foram a melhor opção genética. Queriam riquezas a qualquer custo. Deu no que deu.

–Acha que há condições de controlar os que saírem ao espaço? Ainda mais depois do que aconteceu na base Lunar...?

–Agora não existe a Companhia de Contratação de Índias, Regina – interveio Marcos – estamos armados e nos faremos fortes em Marte. Ninguém chegará lá sem que saibamos. Não vamos a roubar e matar possíveis nativos. Somos conquistadores, mas em outro sentido; todos nós tivemos pais, irmãos, tios ou primos torturados ou mortos por eles, propriedades confiscadas, as vidas dos nossos pais arruinadas... O ódio que nos une também nos fortalece!
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